Houve épocas em que moradores de Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, tremiam de medo quando saíam de casa depois da meia-noite, principalmente no período da Quaresma. Até hoje, alguns sabarenses mais antigos juram, de pés juntos, que já estiveram frente a frente com pessoas que voltaram do mundo dos mortos para assombrar os vivos.
São tantas histórias de arrepiar que tudo foi parar nas 52 páginas do livro “Lendas Urbanas de Sabará: Histórias que o Povo conta....” (Editora Lê Para Escrever), lançado no mês passado durante a Festa Literária de Sabará.
Lenda da Procissão das Almas é muito conhecida em Sabará e marca o período da Quarta-Feira de Cinzas. |
O autor, o funcionário público Francisco Dário, 44, conhecido como Chiquinho Santos, reuniu 21 lendas genuinamente sabarenses e que aguçam o imaginário de muita gente. “Lendas de Sabará, histórias que o povo conta e que não podem acabar”, reforça o escritor.
Chiquinho Santos conta que, desde criança, gostou de histórias de fantasmas. “Nasci numa casa humilde, onde vivo até hoje com meus pais. Segundo relatos dos meus avós, lá era uma fábrica de caixões, que eram usados para enterrar os mortos na igreja São Francisco, que é ao lado da minha casa. Quando eu fazia bagunça, e como meus pais sabiam que eu tinha medo dessas histórias, me colocavam de castigo à noite trancado na igreja escura e mal-assombrada. Apesar do medo, aquilo despertava a minha curiosidade”, lembra o funcionário público.
Uma tia de Chiquinho também contribuiu com as histórias. “Ela contava que uma irmã de caridade saía da minha casa de madrugada com o menino Jesus nos braços, entrava na igreja e desaparecia”, conta ele. Embora seja um “especialista em almas penadas”, Chiquinho garante nunca ter visto uma.
A tia contava uma história, e Chiquinho botava tudo no papel. Uma delas foi a da “Procissão das Almas”, que subia a rua Dom Pedro II. “Entre as almas, tinha uma pessoa maior, que parou em frente à casa da falecida Dona Sinhá, deixando com ela uma vela, pedindo para não apagá-la naquela madrugada serena de Quarta-Feira de Cinzas. A velha, curiosa que era, não cumpriu a recomendação e a vela virou um osso de gente”, conta o funcionário público.
No dia seguinte, reza a lenda contada por Chiquinho, a procissão retornou. “O castigo da senhora foi acompanhar as almas”, conta ele. “A lenda da Procissão das Almas já dura 250 anos desde o princípio de Sabará, que hoje tem 307 anos”, diz. Vizinhos e outros moradores completaram as histórias que constam no livro.
A “Lenda da abóbora” fala de uma mulher chamada Sinhá, muito avarenta, que comprou uma abóbora numa meia-noite chuvosa de um homem que passou na rua. A abóbora sangrou ao ser cortada e dentro havia a cabeça de uma criança.
A Noiva Fantasma da Igreja do Carmo
Diz a lenda que na igreja do Carmo realizava-se um casamento. Os convidados que tinham ido assistir à cerimônia admiravam a beleza do jovem casal postado diante do sacerdote, ele trajando um terno sóbrio, mas elegante, e ela exuberante em seu vestido de noiva rendado e de longa cauda. Todos os presentes mostravam no rosto o sorriso dos contentes, influenciados, certamente, pela felicidade que os noivos demonstravam no olhar radiante que iluminava o ambiente.
Quando chegou o momento do “sim”. Quando o padre perguntou à moça se era de sua livre e espontânea vontade aceitar o rapaz como seu legítimo esposo, ela apenas abanou a cabeça em sinal de consentimento, e em seguida caiu no chão, morta.
Algum tempo depois uma estranha noiva caminhava sozinha pela rua em direção à igreja do Carmo. Parecia trôpega e hesitante, e por isso um homem que por ali passava dispôs-se a ajudá-la. E vieram os dois trocando algumas palavras, até que em dado momento ela pediu ao prestativo acompanhante que fosse embora, pois precisava entrar. O homem perguntou-lhe, então, onde morava, ao que a noiva misteriosa respondeu, apontando com o braço: “ali, no cemitério do Carmo”.
Apavorado, ele saiu correndo pela rua deserta, ao passo que ela simplesmente sumiu dentro do cemitério.
Uma hora depois o homem voltou ao local com alguns amigos. E não teve um só deles que não sentisse um frio estranho lhe correr pelo corpo ao ver que sobre uma sepultura estava jogado um véu de noiva todo sujo e rasgado.
Agosto é considerado um mês propício para o aparecimento de assombrações na cidade. |
Biblioteca foi alvo de aparição misteriosa
A escrava Rosa, bonita de nascença, foi vítima de um crime motivado pela inveja e pela crueldade de sua dona. Até hoje, a alma dela estaria vagando pelo casarão do século XVIII, onde foi morta. No local funciona atualmente o prédio da Secretaria Municipal de Cultura de Sabará, justamente onde Chiquinho Santos, autor do livro sobre as lendas, trabalha. “Essa escrava era muito bonita e chamava a atenção do patrão. Eles tiveram um relacionamento”, conta ele.
A mulher traída, acrescentou, contratou dois capatazes. Rosa foi chicoteada e teve todos os dentes de ouro, presentes do patrão, arrancados: “Antes que a coitada fosse morta, a dona do casarão pediu para colocar a escrava em um buraco para ser enterrada ainda viva”.
Antes de abrigar a Secretaria de Cultura, o casarão era a Biblioteca de Sabará, época de muita assombração, segundo o escritor. “Os livros caíam no chão, as janelas se abriam, as torneiras também, sem ninguém entender, pois era algo do além”, reforça.
‘Mulher do Algodão’ ainda é temida por crianças
A Lenda da “Mulher do Algodão” é a mais assustadora de Sabará. “Aparece uma professora que já morreu, desfigurada, dentro dos banheiros femininos das escolas, vestida de branco, com algodão nos ouvidos e no nariz. Ela assombra as moças que fazem bagunça em sala de aula”, conta Chiquinho. “Até hoje, meninos e meninas de todas as escolas têm medo de entrar nos banheiros à noite”, disse.
A assombração teria começado pela Escola Estadual Paula Rocha, para alunas do antigo Mobral. “Minha irmã foi uma das contempladas pela assombração. Ela não chegou a ver a mulher de branco, mas sentiu arrepios e calafrios. Viu uma sombra no banheiro e saiu gritando”, diz Chiquinho Santos.
Lembranças
Hora dos mortos. A aposentada Maria da Piedade dos Santos, 79, conta com firmeza a experiência, aos 12 anos, com uma mulher de branco que assombrava Sabará. “Minha mãe me mandou buscar dobradinha à noite no matadouro. Quando cheguei ao portão, ia passando uma mulher baixinha, toda de branco, com um cachorrinho que espirrava igual gente. Acompanhei a mulher, e ela me disse que aquela hora era a hora dos mortos. Era assombração”, garante ela.
Confira a matéria feita pelo programa Balanço Geral MG:
Sabará tem assombrações de todos os tipos. |
Confira a matéria feita pelo programa Balanço Geral MG:
As histórias do livro de Chiquinho já viraram filme. O documentário “As lendas e causos de Sabará VII”, da TV Muro Produções, tem 57 minutos e está disponível no YouTube. Assista abaixo:
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirChiquinho sempre foi muito dedicado a respeito das lendas de Sabará tanto é que além do livro que ele escreveu nós apresentamos teatro sobre as lendas nas escolas públicas de Sabará principalmente na época do folclore....
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