Ela já foi vista por mais de 18 mil pessoas, e há alguns anos foi considerada o melhor monólogo nacional pela Academia de Artes no Teatro do Brasil. Estamos falando da peça teatral A Mulher Monstro.
A peça é livremente inspirada no preconceito do dia-a-dia. No ressentimento e na ignorância. Ao melhor estilo das drag queens, Neto incorpora uma caricata mulher de classe alta, cis, branca, religiosa, e com uma visão deturpada de mundo. Ela é perseguida pela própria visão intolerante de sociedade, sem saber lidar com a solidão e as suas relações num tempo de ódio, golpes e corrupções vistos sem nenhuma vergonha. O ator José Neto Barbosa bebe no teatro de revista e no circo pra interpretar a personagem.
A mulher enjaulada vomita uma colagem de declarações “polêmicas” coletadas pelo autor nas ruas, nas redes sociais, e nas declarações de políticos e celebridades. Além de buscar inspiração no momento político e ideológico do país, a peça também traz elementos do conto “Creme de Alface”, de Caio Fernando Abreu, e da personagem Monga, a mulher macaco, atração dos parques de diversões e circos do interior brasileiro.
Pelo fato de a personagem ser uma “esponja” do pior do cotidiano brasileiro, José Neto ressalta que o texto da peça está sempre sujeito a alterações de uma apresentação para outra. “É uma peça que dialoga com o cotidiano. Se pela manhã eu vejo uma notícia no jornal que me interessa, eu estudo maneiras de inserir isso na peça, seja em forma de texto ou performance. É um espetáculo bem dinâmico, que muda a cada sessão”, explica.
Ninguém fica indiferente à monstruosidade enjaulada. José Neto explica que as reações costumam ser as mais variadas. “Em geral as pessoas saem impactadas, algumas chorando. O público aplaude longamente no final”, diz. Mas, claro, há quem pense de outra maneira. O espetáculo já passou por censura em alguns lugares. Numa vez, alguém atirou uma pedra no ator. Há quem só levante e vá embora.
“A peça consegue dialogar com fascistas, pois faz com que eles se enxerguem na personagem – e ela não é algo bom de se ver”, diz o ator. Ele ressalta que sempre antes do espetáculo avisa a plateia que a peça pode acionar alguns gatilhos nas pessoas. “Já estamos preparados para todo tipo de reação, mas no geral, o saldo é positivo pra nós”, diz.
“A Mulher Monstro” estreou em 2016 e já ganhou vários prêmios. O mais recentes foram os de melhor ator e peça no festival Janeiro de Grandes Espetáculos, realizado em Pernambuco há 28 anos. Neto ressalta que apesar de estar muito satisfeito com os prêmios, faz questão de botar o texto de volta na estrada. “Seja qual for seu lado, suas preferências, a peça faz as pessoas refletirem. Em tempos de eleição, acho isso fundamental, não poderia ficar parado”.
José Neto Barbosa atua desde 2002. Atualmente ele se divide entre Natal e Recife – onde atua como gestor cultural. Com “A Mulher Monstro” foi premiado Melhor Monólogo do Teatro Nacional 2017 da Academia de Artes no Teatro do Brasil/Prêmio Cenym, onde em 2015 venceu a categoria Melhor Ator com o solo “Borderline”. Nas duas edições concorreu com nomes consagrados das artes cênicas brasileiras. Na edição 2018 foi convidado para compor o juri de vencedores da mesma premiação. Em 2012 fundou a S.E.M Cia de Teatro, em Natal. O grupo já possui 19 prêmios no currículo.
Recentemente a peça A Mulher Monstro apareceu no documentário nacional "Quem tem Medo? (2022)", exibido durante o Festival É Tudo Verdade 2022, o documentário fala sobre artistas prejudicados pela censura.
Confira o trailer do documentário "Quem tem Medo?", que fala sobre obras teatrais censuradas no Brasil e mostra cenas da peça A Mulher Monstro:
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